quarta-feira, 2 de agosto de 2006






PROLIFERAM AS CEGONHAS, ESCASSEIAM AS PESSOAS

Há cada vez mais cegonhas em Portugal. E ainda bem. Os esforços de preservação da espécie, ocorridos nos últimos anos, deram os seus frutos. A este facto não é alheia, entre outros factores, a sensibilidade ambiental das populações e os esforços desenvolvidos pelos serviços de protecção da vida selvagem. À imagem do que acontece por esse Portugal fora, também em Vila Boa se tem constatado um acréscimo populacional desta espécie de aves. Existem cinco casais de cegonhas-brancas, que fixaram residência nos freixos, árvores muito abundantes na nossa freguesia, e pode observar-se que, na torre da igreja, mais um casal edifica o seu ninho de amor, estando as obras a decorrer a bom ritmo, sendo que, este local emblemático de Vila Boa tinha deixado de acolher estas aves há mais de trinta anos.
Contudo, a vida das cegonhas, tal qual a dos humanos, não está isenta de perigos, incidentes e acidentes, uns provocados por factores naturais, outros consequência do progresso. Em Agosto de 2006, uma destas aves, por distracção, ou talvez por deficiências no “radar”, ou por outro motivo não apurado, colidiu com a rede que delimita o espaço das piscinas, sendo socorrida pelos jovens que se encontravam naquela zona de lazer e pelos vizinhos que, entretanto acorreram ao local do acidente. O certo é que, horas depois, já a cegonha sulcava os céus no seu voo airoso e idílico.
Há dias, aconteceu outro percalço. Este foi ocasionado por um duelo entre duas cegonhas, provavelmente porque cada uma delas reclamava o direito ao seu território. Desta luta resultou um profundo ferimento no dorso de uma delas. Incapaz de voar, a pobre cegonha indefesa foi, uma vez mais, socorrida pela população, que a conduziu à Junta de Freguesia, sendo depois encaminhada para os serviços da Reserva Natural da Serra da Malcata, com a promessa de, uma vez restabelecida, ser largada no mesmo local.
Outras aves têm tido menos sorte, como aquelas que colidem com as linhas de alta tensão, pois nesta situação nada há a fazer. Tem havido alguns casos de aves mortas por electrocussão na nossa freguesia.
Tal como a população, também a Junta de Freguesia tem manifestado uma forte sensibilidade pela preservação desta espécie animal, quer procurando criar condições para a sua permanência, quer prestando socorro sempre que necessário, porque, neste caso, e ao contrário do que diz o provérbio, vale mais dois pássaros a voar do que um na mão.
Porém, se as cegonhas procuram cada vez mais as nossas terras, a verdade é que cada vez menos trazem encomendas no bico. Os nascimentos de bebés são uma raridade e o interior raiano, à imagem do que acontece nas zonas do interior de Portugal, está despovoado, tornando-se portanto necessário e urgente combater agora esta desertificação humana. Estas regiões, caracterizadas pelo despovoamento e por populações envelhecidas, por mão-de-obra pouco qualificada, por baixos níveis de escolaridade, por incipiente e frágil tecido industrial, por técnicas agrícolas ultrapassadas, por reduzida capacidade de atracção de investimentos e, agora, por deslocalização de serviços, estão condenadas à desertificação, se não se tomarem medidas urgentes e drásticas.
No entanto, estes lugares têm mais-valias indiscutíveis. Comportam potencialidades associadas à qualidade paisagística e ambiental, ao património, aos laços enraizados de solidariedade social e familiar, à baixa taxa de banditismo e criminalidade, às acessibilidades aos médios e grandes centros urbanos e à Europa e ainda à paz e tranquilidade que se respira.
Preservemos a vida selvagem, mas não esqueçamos a vida humana.

António Dinis